quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Ralo

Chegou em casa e, sorrateiramente, disse à mulher que estava cansado, pois o expediente havia sido estendido.
Passou quase desapercebido pelo quarto e já foi se dirigindo ao banheiro.
Dizia a si mesmo, a todo momento, que precisava de um banho daqueles, precisava lavar a alma.
Entrou no chuveiro e ficou lá por todos os 20 minutos que pôde ficar.

Saiu do box sentindo-se novo, despido de toda a sujeira que as "horas extras" do expediente impregnaram em seu corpo, sua mente e seu espírito.
Colocou a toalha ao redor da cintura, foi para a cama, beijou a mulher e disse que a amava.

No fundo dos seus pensamentos, ainda tinha as pernas da secretária ao redor da cintura, a camisa jogada pelo chão e seu caráter esparramado pela sala.
Mas havia garantido a si mesmo, que saíra do banho total e completamente límpido, isento de qualquer auto-sentença ou auto-restrição.
Virou de lado, desejou uma boa-noite à mulher e dormiu, sentindo-se leve, novo em folha.

Só que nessa história toda, esqueceu-se de um detalhe não tão fácil de ignorar: quando o banho lava a alma, a sujeira entope o ralo.

2 comentários:

  1. Puxa, fiquei maravilhado. Essa afirmação final é um sopapo no rosto de quem se pôs no papel do sujeito! Parabéns, cara. Contos são a mais difícil empreitada para o escritor, e eu admiro quem os pode escrever bem. Excelente!

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  2. Dá uma olhadinha neste (em inglês) que eu escrevi há tempos... http://fejapimenta.blogspot.com/2009/01/wayward-road-to-gaza.html

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