sexta-feira, 31 de agosto de 2012

atenção

nasce um poema
a cada segundo
agora mesmo
ali na esquina
ou do outro lado do mundo.
pode falar de flor
pedir perdão
falar o que for.
basta prestar atenção
que logo se nota:
o poema acontece
é só olhar em volta.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

tamanho

aos olhos
dos céticos
sou apenas
o que meço
o que ocupo
no espaço.
ao amor
sou o que medem
meus versos
e não estranho
em desconhecer
meu próprio
tamanho.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

ir sem ir

porta afora
ante-
ontem
ontem
e agora
você vai.
ficando.
como se
saísse
entrando.
se fazendo
presente
justamente
por estar
ausente.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

lado

amor
é querer
o outro
ao lado
querer
do outro
o lado
de dentro.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

unidade de(s)medida

minha unidade
de medida
são teus dedos
tuas mãos
à medida em que
tocam os meus
as minhas
e deslizam gentilmente
sobre toda a superfície
do meu corpo
me fazendo existir realmente.
meu relógio é tua respiração
– a contração
e o relaxamento
do teu peito
em determinados momentos –
e a forma como ela
conduz o mundo no teu passo
num compasso manso
(quase mudo)
mas que dá voz a tudo
quando enche e esvazia
seu tórax numa certa frequência
– e por estarmos no mesmo ritmo
enche e esvazia o meu
por consequência.
minha referência de beleza
é a forma como cada centímetro
de você casa perfeitamente 
com a minha preferência
– principalmente quando
por entre os teus cabelos
reluz o sol
e transforma-os
numa espécie de farol
que me guia de noite
me guia de dia.
de tudo isso
esses padrões
referências e medidas
que com você aprendi
o mais curioso
é a forma como desaprendi
a ponderar essa vontade
que vem quando você
me invade.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

(dentro)

havia
um vazio
você viu?
havia
e eu
o via
ouvia
como se
falasse
como
se faltasse
em mim
um pedaço
de mim
quando
enfim
nós nos
recebemos
assim:
como se
faltássemos
em nós
mesmos.

constatação

é nos
desacordos
que eu
acordo.

entre

tudo in-
tenso
imenso
entre nós
entra em
nós
a alegria
de estarmos
todo dia
na mesma
sintonia
no mesmo
tom
mesmo
tão.

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

dança para parar o mundo

nós dois
a girar
para
o mundo
descansar
por um
segundo.

matéria-prima

num instante meu corpo
– de pele
ossos células músculos
e espanto –
esta carnadura
transformou-se
em nobre armadura.
uma completude
me tomou me tornou
uma espécie de receptáculo.
ninguém viu o espetáculo
(o momento exato)
em que determinada matéria
pulverizou-se por todo o oco
do meu corpo agora preenchido
por coisa que não se vê:
matéria-prima de você.

noite noite

tem noite que é
mais escura que a noite.
eventualmente
– deitado de bruços
sobre os braços
ou de lado –
ouço lentamente
o negrume que a mim
se une
e rasteja rente
ao pé da cama.
indago inseguro:
de onde vem
todo esse escuro?
da rua ou
das esquinas de mim?
da noite lá fora ou
da madrugada que dorme
(sob
sobre e dentro de)
mim?
enterro o rosto no colchão
pergunto alto aumento o tom
mas não me ouço
sumo por inteiro.
minha solidão
é um grito preso
no travesseiro.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

portas

ao escrever
o poeta
– sem querer
ou saber se deve –
desenha portas sob
o que escreve.
passagens que levam
às paisagens
– um beijo
uma flor ou
uma nuvem no céu –
que lhe ocorrem quando
a caneta toca o papel.
pois o poeta escreve
sobre o que vive
o que viu
sobre o que existiu
sem estar preparado
(naquele momento)
para deixar o que escreve
– o que descreve –
cair-lhe no esquecimento.
justamente por isso desenha portas
para ter a liberdade
de ir e vir
voltar abrir e fechar
quando tiver vontade.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

o beijo

I

inclinamos as cabeças
(a lados opostos)
para evitar que se toquem
os narizes
– que eventualmente
cumprimentam-se
com carinho
ainda que entrando
no meio do caminho –.
cuidadosos
alternamos os lábios
alternamos os lados
para que nada saia errado.
neste momento
cada um vai construindo
seu próprio movimento
– eu rodando daqui
você girando daí –.
no entanto, é nessa singularidade
nessa discordância
que nos encontramos de verdade
que vibramos na mesma frequência.

II

não há coisa melhor
que em cada beijo
ser você
a última e a primeira
imagem que vejo.

III

toda viagem
é pouca
– curta
demais –
quando
o céu
é o
da boca.

IV

todo beijo
é um poema
mudo.

V

de fato
nossas palavras
se chocaram
mas
nossos beijos
mostraram
que o amor
não está
à míngua
mostraram
que a gente
ainda fala
a mesma língua.

aos pedaços

entre copos
cacos entre
porta-retratos
baratos
rostos
rasgados
restos
de nós.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

deserto de nós

o peso
redutivo
do Sol
sobre
os ombros.
sua sombra
é o que
sobra.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

não cabe

te levo nas brisas
e no clarão das manhãs
te levo nas flores
pelo caminho
e no canto dos pássaros
no topo das árvores
(mesmo quando cantam baixinho)
te levo nas nuvens
que formam desenhos no céu
te levo na chuva que lava
e nos sorrisos retribuídos.
o tempo todo te levo assim
– nas coisas todas –
pois o tanto que levo
mal dá pra caber em mim.

diferentes exatos momentos

passou-se tanto tempo
no entanto nossas mãos
ainda aderem como se nelas
houvesse um velcro
– que as prende gentilmente
sem acorrentá-las mas
sem permitir que
se soltem facilmente –.
nossas bocas ainda se recebem
com o mesmo cuidado antigo.
recebem-se como quando a boca
investiga uma fruta: de maneira sutil,
sem mordê-la apenas tateando-a
com os lábios e seu tato macio.
nossas peles ainda se atritam
se atraem como dois planetas
orbitando o mesmo sol e buscando
o calor que os faz vívidos que os ilumina
dos polos de baixo aos pelos de cima.
nossas pernas ainda se entrelaçam
formando uma trança uma trama natural
tal qual a que o vento forma
– em determinado momento
e deforma da forma mais bela possível –
seus cabelos quando sopra
e os coloca em movimento.
nossos olhos ainda se espiam
em silêncio como se vissem
o que há do lado de dentro
como se vissem que há um
no centro do outro.
nossos braços ainda se dão
ainda constroem casas portos
e fortalezas.
(nossos braços ainda protegem
as mesmas certezas).
passou-se tanto tempo
no entando é como se a vida
fosse a mesma
em diferentes exatos momentos.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

pressinha

ando com
uma pressa
de ter você
de
va
gar
zi
nho.