sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

descostura

as linhas
das minhas
mãos
(acredita-se)
dizem
quem sou
quem vou
ser
se vou ter
uma casa
ou duas
as linhas
das minhas
mãos
dizem muito
menos onde
foram parar
as tuas.

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

tamanho

peso menos
de 60 quilos
não passo
de 1,75m
como cabe
tanto de você
em mim?

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

(v)ai

o que doi
a gente
versifica
só pra
ver se vai.

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

insone

eu nem tive tempo
de ver se você
dorme de lado
ou de bruços
se tem pijama
de loja ou usa só
uma camiseta velha
não cheguei a ver
se você deixa acesa
a luz do banheiro
ou só um abajur
se repousa a mão
sob o travesseiro
ou junto ao corpo
não deu pra ver
se você deixa
o celular na sala
ou sobre o criado mudo
se você não faz
nada disso
ou faz isso tudo
mais uma noite
eu vou dormir
sem saber.

terça-feira, 26 de novembro de 2013

pinta-ponto

o problema
são as pintas
sei de cor as coor-
denadas das suas
onde pousam
na dimensão
das costas
se se escondem
debaixo do pé
ou sinalizam
a curva da cintura
suas pintas são
os pontos a que
Kafka se referia:
quando alcançados
não há possibilidade
de retorno.

parte: ida

refaço sua partida
todos os dias
deixo doer
tudo de novo
quanto mais
vezes você for
mais chances
tem de voltar.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

o ponto

cada momento
é um ponto no espaço
alfinete espetado
no mapa dos dias
ponto de contato
entre o que você
tem e tinha
onde esteve e
tem estado
ponto sem retorno
do que um dia
foi alcançado.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

DDA

por falta de atenção
eu devo ter sumido
entre os e-mails
que você encaminhou
e sob aquela longa pilha
de roupas que você passou
ao tirar a panela do fogo
e comprar comida pro gato
você deve ter esquecido
de manter contato
não foi nada pessoal
ao apagar a luz do banheiro
e fazer as unhas
eu devo ter passado batido
ficado de canto por puro
descuido sem intenção
você teve que comprar
desinfetante e responder
àquele SMS me lembro bem
deve ter sido aí que você
se esqueceu de dar um alô
certamente não foi por mal
sei como é difícil pra você
lembrar das coisas
meu bem.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

durante

por mais duro
que seja
só o agora
é que dura.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

tentaviva

certa vez
tentamos definir
o que é amor
você se lembra?
nada serviu
nenhuma hipótese
ou suposição
nos satisfez
hoje após
o tempo passar
entendo que amor
é isso: tentar.

terça-feira, 29 de outubro de 2013

natimorto

isso que sinto
não tem futuro
é coisa dinamitada
ainda na construção
obra falida
antes da inauguração
é pura e deliberada
implosão
não há vigas tijolos
cimento ou fundação
que sustentem o fato
de eu sentir e você não.

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

a existência visível de um sentimento

mãos não tocam
um sentimento
sua nobreza o isola
da natureza tola
e perecível do homem
no formol da alma
ele se conserva
se reserva
até o momento
em que se vale
de um entrelaçar
de dedos
de um telefonema
sem motivo algum
até de uma piada
horrível que te faz rir
para que aos olhos
do mundo ele possa
finalmente existir.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

tudo ou nada

pegue uma
coisa qualquer
e corte
na metade
pronto
você tem
dois inteiros.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

casa dois

ver seu carro
na porta
do meu prédio
é bom
poder entrar
e nele encontrar
você é melhor
como se eu saísse
de casa e entrasse
em casa de novo.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

estático

entre indas
e vindas
o que ficou
foi esse
ainda.

(dú)vida

viver é
uma ciência
inexata
não se sabe
precisar
exatamente
o que
se precisa.

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

enquanto

há em mim
um desejo
de não deixar
pedaços
pelo caminho
sem passo
sem vestígio
ser inteiriço
pra que a vida
seja só
enquanto isso.

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

distâncias

a nível atômico
nossa distância
é inalcançável
em metros
dá pra erguer
um arranha-céu
em palmos
é possível tatear
um planeta mínimo
em pensamento
é questão
de milímetros.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

poema para uma amiga que chorou o dia todo

o choro é
o transpirar
da alma exausta
que carrega
um certo peso
por um certo
motivo
e vaga em alguma
névoa-mágoa
buscando
a si mesma.

terça-feira, 20 de agosto de 2013

amor não é

amor não é
eu devia
ter feito mais
nem a culpa
é toda sua
amor não é
você tem que ser
porque eu sou
amor não é amor
só depois
que acabou.

abismo

sou uma implosão
iminente
um desastre
ambulante
fadado a cair
no meu próprio
abismo
sem fazer alarde
indo cedo
ou um pouco
mais tarde.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

lições

algumas lições
eu não quero
aprender
faço questão
talvez eu passe
desse ano
talvez não
vai saber.

terça-feira, 13 de agosto de 2013

portas

todo poema
é porta
atalho saída
de emergência
para o que
um dia foi
e hoje é distância
escrever é chegar.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

nenhum

nenhum sorriso
sincero
se esconde
dentro da boca
só atrás da alma.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

escaleno

nasci escaleno
e obcecado
por desenhar
uma vida
que flua mais
como círculo
e menos
como quadrado.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

mãos e clavículas

eu digo que gosto
de mãos
e você
de clavículas
nem me pergunto
porque
e pouco importa
já que cada um
gosta
do que bem entender
como você
de clavículas
e eu de você.

terça-feira, 23 de julho de 2013

sete palmos ou mais

na hora
de enterrar
um amor
que já foi casa
toda cova
é rasa.

sexta-feira, 19 de julho de 2013

velcro

as coisas
têm velcros
que aderem
à aspereza
da pele
fica difícil
desgrudar
sem puxar
com força
sem deixar
o corpo
em carne viva
mas uma hora
certas coisas
têm que
morar no tempo
e não mais 
em nós.

necessidade

há duas camas
de solteiro
no meu quarto
toda noite
faço tudo igual
junto as duas
bem coladas
e mesmo assim
não dá uma
de casal.

quarta-feira, 17 de julho de 2013

ocupação

uma coisa
tem que ocupar
o lugar da outra
não é à toa
caso contrário
tudo dentro
se amontoa.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

apenas

você já foi
um grito
hoje
não passa
de um eco.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

torcer

nunca soube
desfazer laços
o lugar exato
onde puxar
algum passo-a-passo
para seguir
nem imagino
vou puxando
de qualquer jeito
e torcendo
para que o torto
vire direito.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

patologia

a gente sempre alimenta
uma esperança
pelo que se foi
é tão natural
quanto o próprio
partir da coisa
que quando vai
deixa um caco um eco
uma farpa uma ponta
que cresce dentro
e inflama
ninguém imagina
mas a esperança
é a mais maldita
das doenças.

sexta-feira, 5 de julho de 2013

felicidade

não quero muito
coisa pouca
só o bastante
pra que sorrir
não me rasgue
mais a boca.

quinta-feira, 4 de julho de 2013

fratura

quer amar?
ame à vontade
querida
mas se prepare
porque todo amor
vai virar ferida
e esteja disposta
porque toda
fratura vai ser
para sempre
exposta.

terça-feira, 2 de julho de 2013

âmbar

seu nome
é uma chama
dizê-lo
é um suplício
me queima
a boca
enche de bolhas
a gengiva
arde as paredes
da garganta
seu nome
é uma chama
e ainda assim
o chamo.

segunda-feira, 1 de julho de 2013

chuva

o amor é uma chuva
que vem de lado
vem ven-
tando
e nos encontra
debaixo dos
guarda-chuvas
dos telhados
e de incontáveis
e impermeáveis
blusas.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

duro

o que antes era
rosa e poesia
hoje é azia e prosa
o começo pode ter
champagne
e festa de abertura
mas no fim
o fim é o que
eternamente dura.

quinta-feira, 27 de junho de 2013

O que não tem volta nos obriga a ir.
Amar é abraçar pelo lado de dentro.
Amar é querer receber a mesma visita todos os dias.
A saudade é uma esperança que dói.

terça-feira, 25 de junho de 2013

o amor (do outro) acaba

O suco de manga ficou inteiro quando o amor acabou. Não descia, sabe? Ficou lá, na mesa. Quando o amor acabou. Tinha um amarelo tão vivo. Um amarelo-manhã-de-sábado. E ali, na presença daquele amarelo metálico, o amor acabou.

Ela pediu uma água e disse coisas. Um monte. Disse que a gente não se fazia mais bem. Que seu peito doía. Que era ficar sem mim que ela queria. Eu prestei atenção em algumas, porque seus lábios me confundiam. Eles se movimentavam de uma forma mais rápida que o normal. Com pressa. Ora saía som. Ora não. E a cada palavra somada à conversa, o amor ia acabando. 

Ela tomava um gole d'água pra molhar a garganta. E descansava um pouco. Nesses silêncios eu ficava olhando o suco. Amarelo ouro. Tão precioso. E intacto. Não dei nenhum gole. Só mexi um pouco, com o canudo. Senti como era espesso. Fibroso. Nutritivo. 

De vez em quando eu olhava nos olhos dela. Eles que falavam quando a boca estava muda. Falavam vazio. Escuro. Abismo. Eu tentava mergulhar pra trazê-los de volta. Mas só os afundava mais. E me afogava mais. E o suco de manga ali. Vivo. Completo. E o amor ia acabando, enquanto ela falava. E ela ia tomando a água enquanto falava. E eu olhava seus lábios se movendo mais um pouco. E eu me confundia mais um pouco. 

Não conseguia mais me prender à mesa. À cadeira. Não conseguia me prender a mim. Era como se eu estivesse voando ao contrário. Me enterrando vivo, sabe? Cada palavra dela era uma pá de terra. Eu fui sentindo a pressão no peito. Esmagando as costelas. E o amor ia acabando. E ela ia ficando mais leve. E tomava mais um gole d'água. Tirando um peso das costas. Um peso da boca. Gritando o peso das palavras. Seu alívio me pendurava âncoras na alma. 

E o suco de manga ali. Intocado. Hermético. E ela falando. E eu ouvindo. E ela mexendo os lábios. E eu mexendo o suco. Com o canudo. Com cuidado pra não derramar. Tentando entender o porquê daquilo tudo. Do nada. Porque sabe, ela me amava semana passada. Mas a semana passada passou. O amor passou. A água dela acabou. A conversa acabou. O amor acabou. Pagamos a conta.

A atendente perguntou se eu ia tomar o suco. Disse que não. Que podia levar. Daquele jeito. Amarelo, precioso, espesso, intacto, fibroso, nutritivo, vivo, completo, intocado e hermético. Igualzinho ao que eu carregava dentro do peito. Ela levou. O suco. O amor, não. Esse ficou. 

tatuagem

cada sorriso seu
marca
cada abraço
beijo de oi
cada mensagem
elogio
eu guardo
cada almoço
olho no olho
seus óculos
o jeito que fuma
parece mágica
como tudo isso fica
retido bem aqui 
no centro
você nem imagina
mas tem me tatuado
por dentro.

quinta-feira, 20 de junho de 2013

o segredo é

criar expectativas
em gaiolas
com visitas
controladas
alimentá-las
apenas com
o necessário
e nunca torná-las
confiantes a ponto
de criarem asas
e confundirem você
com uma espécie
de casa.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

triste conclusão

viver é um ofício
nunca mais fácil
só menos difícil

sonho

tive um sonho
em que eu escrevia
sem parar
um poema
atrás do outro
dia após dia
até que
de repente
a vida toda
virava poesia.

juntos

dar uma rosa
e um riso
dar tudo
ou nada disso
ser do outro
parte integrante
e habitá-lo
tal qual um inciso
até ter a certeza
de nunca mais
ser indeciso

troca

tomar os problemas
do outro
como se fossem
nossos
e no fim ganhar
outra pele
para descansar
os ossos.

das menores coisas

a menor das solidões
não consegue
ser sutil
pisa como um elefante
que ao invés
de quatro patas
tem quatro mil
pesa como
um planeta errante
de rocha gelo e vazio
passa como o sangue
mais espesso
pelo mais fino funil.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

sumindo

a passos largos
se move a vida
com seus até logos
sempre de partida
tudo é coisa passada
feito o crepúsculo
que é uma luz
quase apagada
é o tudo
se transformando
em nada
o inteiro
virando metade
pois é lá
que a vida mora:
na saudade.

gelo

o amor acaba
no conforto
do inverno
e doi nos ossos
igual banho gelado
de manhã
doi dentro e fora
só pra doer dobrado
doi hoje e amanhã
encurta os cobertores
aumenta o apartamento
doi nos arredores
de todos os momentos
o amor acaba
no conforto
do inverno
e some com um pé
dos pares de meia
hiberna toda nossa disposição
e cria teias
nas esquinas do coração
o amor acaba
no conforto
do inverno
mais belo
e sua lembrança sempre queima
feito pedra de gelo.

aos quarenta

talvez lá pelos quarenta
a gente se veja de novo
numa esquina qualquer
na padaria ou supermercado
talvez você tenha engordado
e eu esteja com uma mulher
talvez você nem tenha mudado
e eu ainda tente entender
talvez você esteja com ele
(ou esteve sempre sem eu saber)
talvez você me veja
e finja que não
talvez eu que veja você
e continue olhando pro chão
talvez a gente se cruze
e você pegue a minha mão
talvez você me confunda
talvez não
talvez você seja mãe
e eu ainda more com a minha
talvez a gente se lembre do que tinha
mesmo tendo lutado pra esquecer
talvez a gente só se cruze
sem perceber.

carreto

eu mobiliei o peito
pra te receber
com flores e quadros
que mandei trazer

comprei sofá e mesa
pra tevê
e um monte de espelhos
pra te ver

se eu soubesse
o trabalho que ia dar
pra juntar tudo
e mandar retirar

teria perguntado
quanto tempo pretendia ficar
se tava de passagem
ou tinha vindo pra morar

se eu soubesse o tanto
que sei agora
teria te recebido
do lado de fora

sexta-feira, 7 de junho de 2013

palavra

toda palavra
é pouca
não tem olho
só boca
e se 
não dá 
pra olhar
não dá
pra acreditar.

terça-feira, 4 de junho de 2013

espesso

a dor é espessa
não escorre
entre os dedos
não se dissipa
nem se dilui
entope
toque-me
para transformar
em água
toda mágua
torpe.

Para Helga. Inspirado em Elena. E Guimarães Rosa.

quanto dizem os silêncios

você preferiu
ir embora
sem fazer barulho
foi aos poucos
de mansinho
antes de sair o sol
sem desarrumar
o lençol
rastejando pela margem
confundindo excesso de zelo
com falta de coragem
a ponto de me deixar
só um silêncio agudo
sem sequer pensar
que silêncios assim
(por si só)
dizem tudo.

sorriso universal

nada de dente
maxilar gengiva
e mandíbula
em você
essa limitada
anatomia
vira poesia
e só se vê
um sorriso
- que de tão
intenso e
profundo -
poderia sorrir
todas as bocas
do mundo.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

eu

esperando
o dia em que
voltarei a ser
minha melhor
companhia.

encaixe

gostava de vestir
meu corpo
com o teu
torná-lo
segunda pele
de mim
num encaixe
tão justo
que mal cabia
a ideia de fim.

formol

esquecer
tinha que ser
no ato na hora
morreu
foi embora
sem cerimônia
e canções
com acordes
bemol
sem insônia
e esse cheiro
de formol.

quarta-feira, 29 de maio de 2013

voo

de que adianta
dinamitar pontes
se aos montes
as lembranças
voam?

barulho

sob o entulho
da vida
resiste um barulho
chamado poema.

terça-feira, 28 de maio de 2013

de hoje em diante

todo ontem
vai ficar
pra trás
ali perto
do nunca mais
preso por uma
corrente
pra que a vida
seja só daqui
pra frente.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

ais

um beijo
tchau
até mais
por que quando
o amor se vai
não leva junto
seus ais?

saída

do amor
nunca se sai
por onde entrou
as portas
mudam de lugar
trocam-se
as fechaduras
algumas vezes
leva uma vida
para encontrar
a saída.

até

você me deu
um abraço
e um silêncio:
os dois duram
até hoje.

quinta-feira, 23 de maio de 2013

amor e sombra

no amor mais justo
ainda haverá sobra
feito qualquer luz
que ao iluminar
faz sombra
em algum lugar.

quarta-feira, 22 de maio de 2013

inesperado

aí você volta
de repente
e tudo volta
de repente
e o mundo
volta a ser
só a gente.

terça-feira, 21 de maio de 2013

existindo

você não existiu um dia
não lembro quando
mas houve um dia
em que pra mim
você ainda não existia
e eu existia existia demais
com todos os meus poros
pedaços ossos e coragem
eu existia pra valer
como os dinossauros existiram
um dia como as múmias
as bruxas as civilizações
pré-colombianas existiram um dia
aí você existiu pra mim
e existiu em mim
por um tempo por um ano por um século
e morou em mim e mobiliou meu peito
e pintou as paredes e fez o sinteco
aí você demoliu tudo e não existiu mais
e deixou um monte de entulho e um eco
da porta batendo da parede ruindo
do teto caindo e eu me segurando
pra continuar existindo e lembrando
que eu já existi enquanto você
não existia em todos os meus poros
pedaços ossos e coragem
e rezando pra me encontrar de novo
mas há uns tempos atrás
naqueles dias em que você
ainda não existia.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

traz

de vez
em quando
a vida traz
um que
faz tanto
e outro que
tanto faz.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

esmola

não é comigo
viver de troco
querer o que
falta muito
pra ser pouco.

quinta-feira, 16 de maio de 2013

tempo ruim

ao tempo
às vezes
falta uma
pressa
pra que ele
passe
sem que
a gente
peça.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

ponto final

se minha dor
lhe é alheia
peço que pare
e me leia
passe os olhos
pelos polos
passeie
pelos pelos
se nada vir
olhe mais fundo
sob a pele
quem sabe
sob o cabelo
entre as costelas
se ainda assim
nada vir
pegue minha mão
que eu aponto
onde dói
e você põe
logo um ponto.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

borracha

com esforço
tudo na vida
se apaga
linha por linha
até que o vazio
seja a coisa
completa
pois sozinha
a vida
nada passa
à caneta.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

ontem

tristeza máxima
falta olho
para tanta lágrima

terça-feira, 7 de maio de 2013

nenhum pio

noites em claro
queria eu poder
chamar o sol
antes dos pássaros.

segunda-feira, 6 de maio de 2013

deboche

a vida
ri
de mim
e passa
e eu
não acho
graça.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

esperança

a gente faz
de tudo
quando
não pode
fazer nada.

sol de dentro

gosto quando
faz Sol em você
e você brilha
igual um diamante
de mil faces
com cores vibrantes
que pintam o vazio
numa intensidade
que é só sua
ao mesmo tempo
gosto de você Lua
acendendo o céu
lá fora
feito uma manhã
fora de hora.

quinta-feira, 2 de maio de 2013

nunca mais

há assuntos
que viraram feridas
ainda assim
arranco a casa
deixo a pele exposta
até achar uma resposta
que me satisfaça
e a paz transforme
tudo em nunca mais.

terça-feira, 30 de abril de 2013

o corpo ama

sou meio corpo
e meio alma
meio sonho
e meio cama
o amor dá conta
de um pedaço
uma metade talvez
um pouco mais
o resto fica
por conta
da boca
da mão
do que com o meu
o seu corpo faz.

terça-feira, 23 de abril de 2013

eu sinto demais

eu sinto demais
demasiado
qualquer deslize
é pecado
qualquer mentira
conspiração
qualquer beijo
amor eterno
qualquer erro
condenação
qualquer crítica
afronta
qualquer conselho
intromissão
qualquer toque
sexo
qualquer promessa
dívida
qualquer dívida
dúvida
qualquer porta
única
qualquer olhar
sim
qualquer festa
última
qualquer laço

qualquer tchau
adeus
qualquer oi
entre
qualquer deus
redenção
qualquer talvez
permissão
qualquer perda
luto
qualquer amor
pouco
qualquer coisa
sinto muito

segunda-feira, 22 de abril de 2013

eterno (em termos)

se jamais
fosse menos
que nunca mais

quarta-feira, 17 de abril de 2013

camiseta e cartaz

- Essa dele sorrindo?
- ...
- Essa dele comendo?
- ...
- Essa dele dormindo?
- ...
- Essa dele correndo?
- ...
- Essa de homem aranha?
- ...
- Essa enquanto bebê?
- ...
- Essa fazendo gracinha?
- ...
- Essa em que ele parece você?
- ...
- Essa na ponte?
- ...
- Essa de ontem?
- ...
- Escolhe uma. Tem que ser alguma. Amor. Pra todo mundo ver. Na felicidade dele nossa dor. Uma foto. Pra ele viver de novo. Pra colocar em cartaz. Pra lutar. Pela paz. Estampar em camiseta. Nessa passeata.
- Não quero foto. Nosso filho morto. Em imagem. Impresso. Se quiser, leva a que trago dentro. No meu avesso. Leva pra avenida. Essa ferida. Esse meu resto de vida. Em carne viva. Que é onde ele mora. Agora.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

auto-ajuda

de-
sacreditar
de
si
transforma
sim
em
se

domingo, 31 de março de 2013

arde

do outro
a gente nunca
sabe tudo
sempre há
um pedaço
que grita
e outro
que fica mudo
o que do outro
a nós é oculto
milagrosamente
transforma clareza
e verdade
em vulto
o que a gente
não sabe
é sempre
o que mais
arde.

quarta-feira, 13 de março de 2013

carne e alma

um corpo junto
a outro
invadindo-se
por um momento
moldando-se um
ao outro
como molda-se
a água a um copo
como molda-se
a vontade a um topo
como molda-se
o pouco a um todo
dois corpos juntos
sendo juntos
apenas um
sendo todos
apenas sendo dois
trocando seus pesos
suas densidades
trocando por agora
seus depois
trepando seus interiores
seus íntimos valores
até deixarem
seus estados anteriores
de corpos orgânicos
de doença pecado pânico
perecíveis
e virarem almas
- corpos limpos eternos
invencíveis.

segunda-feira, 11 de março de 2013

lembrar sempre

de querer
uma vida
de certezas
trocar planos
e vamos ver
por vamos

sexta-feira, 8 de março de 2013

move-dor

erga
um monumento
adore por
um momento
sua dor
sem ela
você chega
até aqui
com ela
aonde for

segunda-feira, 4 de março de 2013

parte

se
ir inteira
você não
precisasse
se
ao menos
sua sombra
sobrasse

sexta-feira, 1 de março de 2013

circunscrito

nenhum poema
diz tudo.
só consegue dizer
o que sua estrutura
permite
o que não vai além
do seu próprio
limite.
ainda que o poema diga
– em si mesmo
em seu tudo –
é como se tentasse
dizer como se fosse
quase mudo.
sempre haverá
algo (a mais) a ser dito
já que o poema
só existe em si circunscrito.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Plano B

A-
mar
não tem
plano
B.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Flor

encontrar a beleza
de cada dor
decidir se o que
lhe abre o peito
em explosão
vai ou não
transformá-lo em flor.

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Esqueleto urbano

Dar a um prédio a vida
é algo paradoxal, intrigante.
Inicia-se por seu finalmente:
um esqueleto de vívidas vigas,

Que de morte nada há de trazer
pois é esqueleto de gênese, começo,
no qual pulsa algo quente, um vir a ser,
um tipo de vida latente, de aço.

domingo, 27 de janeiro de 2013

Santa Maria (Experimento Cabralino)

a morte é uma ferida
em carne viva, quente
que se abre para dentro,
sob a pele, latente.

ferida sem sutura
por sua demasiada profundidade
e complexa estrutura
arde aberta, infinita.

sem compressa que a estanque,
ou cirurgia que no ato a reduza
sangra abundantemente e aflita
cumprindo o dever de ferida difusa.

contra tal ferida
não há como se precaver
pois ela se abre, rasgada,
aleatória, a quem a vida escolher.

no entanto a mesma vida há de trazer
no tempo um sopro macio, antibiótico
que toda dor minimiza e qualquer ferida
ainda que não se feche vê-se reduzida.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

A Alice Ruiz

quem lê Alice vê
um trabalho de anos 
afiado, amolado 
por um talento liso, 
de pedra, tal qual uma esfera 
livre de arestas, que medra 
o mesmo tanto que alisa. 
um talento espada,
de nobre fio, asitático,
de corte frio, prático,
cuja lâmina elimina sobras
tornando cada poema
escudo de quem ler
e quiser bater
de frente com a vida,
para fazê-la caber no verso.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

depressão

houve dias em que
corpo e cama eram um
não se sabia ao certo
o que era cama
o que era corpo
– se a cama havia virado
a fôrma do corpo
ou se o corpo havia tomado
a forma da cama –
era como se a cama
fosse o leito de um coma
induzido pela própria mente
era como se a alma
estivesse doente.
cama coma corpo casados
arrastando-se sob os pesados
lençois da melancolia.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

abraço

abraço bom
não parece laço
– que pra soltar
basta um puxão
e só –
abraço bom
é aquele
que parece
nó.